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(Mulher inteligente)

 
Mulher inteligente
- © Lenise M. Resende -

Inúmeras vezes, escutei alguém dizer: "Você é muito inteligente para uma dona de casa!" Então, passei a maior parte da vida, exercendo a profissão certa pra mim - dona de casa.

É preciso inteligência para saber:
- que a roupa clara deve ser lavada separada da escura,
- que roupas atoalhadas devem ser lavadas em separado,
- como lavar tecidos delicados,
- como lavar roupas que largam tinta,
- como tirar manchas das roupas,
- como colocar roupas de molho,
- que há diferenças entre tipos e marcas de sabão,
- que há diferenças entre os alvejantes e os amaciantes,
- que a quantidade de sabão em pó na máquina de lavar precisa ser dosada,
- como torcer roupas lavadas,
- que a roupa lavada precisa ser bem colocada no varal,
- que a roupa retirada do varal deve ser guardada dobrada ou em cabide (camisas),
- que lavar e passar roupa parece simples mas, não é, se considerarmos que nossas roupas precisam ter durabilidade, estar limpas, bem passadas e, se possível, cheirosas.

Uma pessoa que cozinhou durante vinte anos sem gostar, dificilmente fará uma boa comida. Até para fritar um ovo, é preciso gostar. Se eu pegar a frigideira resmungando e o óleo me lamentando, quando quebrar o ovo, vai ser com mão de pugilista pronto a desferir um golpe fatal no adversário.

Tudo será diferente se, calmamente, eu escolher a frigideira. Dosar a quantidade de óleo, deixando o vasilhame por perto (para o caso de ser novamente necessário). Quebrar os ovos em um prato fundo com cuidado (há sempre a possibilidade de haver um ovo estragado). E, depois, colocá-los na frigideira, lentamente, para que se espalhem por igual no óleo. O fogo médio os deixará no ponto ideal para serem salgados, com bem dosadas pitadas de sal.

Quando estiverem prontos, deixo-os escorregarem da frigideira para uma travessa. E, ao usar o bom humor e a paciência, serei duplamente recompensada, ao comer um prato saboroso, sem estar preocupada com a hora de lavar a frigideira.

Ainda bem que essa profissão nunca me deixará desempregada - os filhos crescem e nascem os netos... E, quem quiser, pode guardar a receita acima no caderno de receitas - chama-se: "ovo frito amoroso" ou, se preferir, "amorovo".

(08 de março - Dia Internacional da Mulher)

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(Mujer Inteligente)

 
Mujer Inteligente (Mulher Inteligente) foi traduzido por Word Awareness, Inc., uma rede de tradutores estabelecida na Califórnia, nos EUA. E publicado no blog Cuentos Brasileños de la Actualidad (CBA), dedicado a contos de escritores brasileiros contemporâneos. Visite o blog!
 
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Mujer Inteligente
- © Lenise M. Resende -
 
Incontables veces escuché a alguien decir: "¡Eres demasiada inteligente para ser ama de casa!" Así pasé la mayoría de mi vida, ejerciendo la profesión adecuada para mí: ama de casa.
 
Se necesita inteligencia para saber:
- que las ropas claras se deben lavar por separado de las oscuras,
- que las ropas atoalladas se deben lavar por separado,
- cómo lavar las prendas delicadas,
- cómo lavar las ropas que sueltan tinta, 
- cómo eliminar las manchas de la ropa, 
- cómo poner la ropa en remojo, 
- que hay diferencias entre los tipos y las marcas de jabón,
- que hay diferencias entre el cloro y el suavizantes para la ropa,
- que hay que medir la cantidad de jabón en polvo que se pone en la máquina, 
- cómo estrujar las ropas lavadas,
- que las ropas deben estar bien colocadas en el tendero,
- que las ropas retiradas del tendero se deben guardar dobladas o en la percha (camisas),
- que lavar y planchar las ropas, lo que parece algo sencillo, pero no lo es, teniendo en cuenta que las ropas deben ser resistentes, estar limpias, bien planchadas y, si es posible, perfumadas.
 
Si una persona cocina durante veinte años sin amor, es poco probable que haga una buena comida. Hasta para freír un huevo, hay que hacerlo con gusto. Si agarro el sartén mientras me quejo y el aceite mientras me lamento, al romper el huevo lo haré con la mano de boxeador listo para asestar un golpe mortal a su oponente.
 
Todo será diferente si, calmamente, elijo el sartén, pongo la cantidad de aceite y dejo la botella cerca (en el caso de que necesite más), rompo los huevos con cuidado en un plato hondo (siempre existe la posibilidad de que haya un huevo malo) y luego los pongo en el sartén, poco a poco, para distribuirlos en el aceite uniformemente. A fuego medio, estarán perfectos para una buena pizca de sal.
 
Cuando estén listos, les dejo deslizarse del sartén a un plato y, si tengo buen humor y paciencia, seré doblemente recompensada, mientras como un plato sabroso sin preocuparme cuándo debo lavar el sartén.
 
Afortunadamente, esta profesión nunca me dejará en paro; los niños crecen y luego nacen los nietos... Y el que quiera puede guardar la receta anterior en cuaderno de recetas ― se llama "huevo frito amoroso" o, si se prefiere, "amorhuevo".
 
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(The Clever Woman)

 
The Clever Woman (Mulher Inteligente) foi traduzido por Word Awareness, Inc., uma rede de tradutores estabelecida na Califórnia, nos EUA. E publicado no blog Contemporary Brazilian Short Stories (CBSS), dedicado a contos de escritores brasileiros contemporâneos. Visite o blog!
 
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The Clever Woman
- © Lenise M. Resende -

Time and time again I hear someone say, "You're too clever to be a homemaker!" I guess I've spent most of my life in the right career for me: taking care of the house.

You need to be very clever to know certain things:
- white clothes should be washed separately from the colored ones,
- plushy garments should be washed by themselves,
- delicate fabrics need special wash,
- clothes that bleed need special care too,
- how to remove stains,
- how to soak some items before washing,
- there are different kinds and brands of soap,
- there are different kinds of bleach and fabric softeners,
- the amount of soap that goes into the washer needs to be measured,
- some clothes should be rung after washed,
- how to arrange clothes in the clothesline,
- how to fold or hang clothes after they're dry,
- washing and ironing sound easy, but we need to keep in mind that clothes have to last, be clean, wrinkle-free and, if at all possible, smell good.
Someone who's been cooking for 20 years and hates every minute of it will hardly make good food. You need to like it, even if we're talking about frying an egg. If I'm complaining as I grab the frying pan and the oil, I'll break that egg like a boxer who wants to knock down an opponent.

Everything will be different if I calmly select the best pan, then pour a little oil and leave it nearby, just in case I need it again. Then I'd break each egg carefully and separately, just in case one of them is actually bad. I'd slowly put them in the pan and let them spread equally through the oil. At medium heat, they'd soon be ready for a pinch of salt.

When the eggs are well done, I can let them slide from the pan to a serving dish. With some good humor and patience, I'd get double the pleasure in enjoying a nice meal and not worry about scrubbing hard to clean the frying pan.

I'm actually glad I'll never get fired from this position, because after the kids are all grown up, here come the grandkids... And, if you want to write down the recipe above, you can call it "Lovely Eggs" or, if you'd like, "Eggs of Love".
 
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(O doce amado)

 
O doce amado
- © Lenise M. Resende -

Enrolar a massa do brigadeiro, o doce mais amado pela família, é uma tarefa ao mesmo tempo simples e complicada.

É simples, porque basta untar as mãos com manteiga, pegar um pouquinho da massa, colocar na palma de uma delas e enrolar. Depois que a bolinha está pronta, é só passar no açúcar ou chocolate granulado, que foi colocado num prato.

É complicada, porque é difícil controlar a nossa gula, e a das pessoas que aparecem para dar uma espiadinha. Não é um doce de cheiro muito forte, mas a notícia de que ele está sendo feito se espalha rapidamente pela casa.

Aqui em casa, o guloso mais comportado acaba sendo o cachorro. Ele sabe que algo gostoso está sendo feito. Por isso, fica sentado perto da mesa, quietinho, acompanhando com olhos atentos os movimentos das mãos que enrolam o doce. Ele só fica mais agitado quando alguém encosta na mesa e tira sua visão da cena. Mesmo que a chance de um brigadeiro cair no chão seja mínima, ela existe. Então, não custa nada para ele ficar ali de plantão.

Os gulosos mais pacientes sempre aparecem para apanhar alguma coisa ali perto, ou fazer uma pergunta qualquer. Já os impacientes, quando aparecem, vão direto ao assunto, e perguntam se podem experimentar. Depois que o doce é aprovado, eles aproveitam e pedem para saborear mais um.

Se os brigadeiros estão sendo feitos para uma festa, fica mais fácil negar os pedidos. Mas, se estão sendo feitos como sobremesa, fica difícil resistir ao argumento daqueles que preferem colocar a massa em copinhos, para agilizar o consumo.

Os gulosos mais apressados não querem saber de enrolação. Enquanto o doce ainda está no fogo, decretam que nem é preciso colocar num prato e, assim que a massa esfriar, que cada um da família pegue a sua colher, porque não tem nada melhor que raspar panela de brigadeiro.

Existem vários tipos de apreciadores de brigadeiro, mas certamente esse é o doce mais amado pelas famílias brasileiras. Ouvir seu nome já é o suficiente para ativar nossa memória gustativa, recheada de variadas lembranças.
São recordações engraçadas, de festas onde a dona da casa, por medida de economia, batizava o doce com amido de milho, deixando-o duro de mastigar. E, revoltadas, as crianças faziam uma guerra com os brigadeiros, para desespero de suas envergonhadas mães.

São recordações alegres, de comemorações onde as crianças disputavam para ver quem comia mais docinhos. E, também, recordações tristes, de momentos de dor ou solidão amenizados por uma panela de brigadeiro, saboreado com o acompanhamento de lágrimas.


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Nota - Crônica jornalística (apresenta aspectos particulares de notícias ou fatos cotidianos)
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(Casa na cidade)


Casa na cidade
- © Lenise M. Resende -

Quem já ouviu Elis Regina cantando a música Casa No Campo, pode achar essa interpretação inesquecível. É o meu caso! Mas não quero uma casa no campo. O campo é bonito pra se visitar, e eu quero uma casa para morar.

O que eu quero é uma casa na cidade, perto do mar, mas que não seja em frente à praia. Gosto da areia e do mar, mas não da maresia. E o mesmo mar que me encanta nos dias de sol, me assusta nos dias de tempestade e nas noites sem lua. Gosto de olhar as ondas do mar, mas me banhar em águas mais tranquilas. E o mesmo vento que me agrada quando é brisa, me agride quando sopra intenso, com rajadas fortes.

O que eu quero é uma casa pequena, simples, e confortável. Uma casa fácil de arrumar e de limpar. Um lugar mais pra viver do que trabalhar. Um lugar para viver com simplicidade, andar descalça, ouvir o silêncio, admirar e ouvir os sons da natureza.

Já morei em casa e gostei muito de fazer tudo isso. Era uma casa na cidade grande, mas num local meio isolado, silencioso. Num lugar alto, longe do mar, de onde se avistava um pedaço da Ponte Rio-Niterói. Após dois assaltos, decidi que só iria morar em apartamento. Só que recentemente vi algumas fotos, numa revista de decoração, de uma cabana de pescador que foi reformada, e me apaixonei por ela.

Ela me fez lembrar de uma casa de praia que compramos em Cabo Frio, fizemos algumas melhorias e depois vendemos. Ficava num condomínio, construído num areal, perto de uma lagoa. Na época, as ruas não tinham calçamento e as casas eram quase iguais, feitas com tijolinho envernizado, piso de lajota de barro, e janelas de madeira com veneziana. A cozinha era conjugada à sala, e a bancada que separava os ambientes servia como mesa. O sofá tinha a base de alvenaria, e os quartos tinham suas camas construídas da mesma forma.

A simplicidade facilitava a limpeza, já que bastava a casa ficar alguns dias vazia para que a areia a invadisse. Para torná-la novamente habitável era necessário sacudir os colchões e as almofadas, varrer o chão, e espanar a areia fina dos pouquíssimos móveis. Para fazer uma faxina, bastava tirar de dentro de casa o que não podia ser molhado. Depois, era só pegar a mangueira do jardim e lavar a casa. Em pouco tempo a casa estava limpa, seca, fresca, e com cheirinho de terra molhada.

Não me importaria se, por algum motivo, a casa que eu quero se transformasse em um apartamento pequeno, simples, e confortável. Mas continuaria querendo: um lugar fácil de arrumar e de limpar; um lugar mais para viver do que trabalhar; um lugar para viver com simplicidade, andar descalça, ouvir o silêncio, admirar e ouvir os sons da natureza. Porque, no fundo, o que eu mais quero é viver em paz.
 
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Nota - Crônica jornalística (apresenta aspectos particulares de notícias ou fatos cotidianos)
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(Faxina de inverno)

 
Faxina de inverno
- © Lenise M. Resende -
 
Cada família tem seus costumes, em relação a frequência da limpeza da casa. Em relação a faxina, a grande limpeza, acontece o mesmo. Algumas famílias preferem a faxina semanal, outras preferem a mensal. Já a faxina anual, aquela em que as pessoas consertam ou se desfazem de roupas e objetos que não usam mais, no Brasil, costuma ser feita antes do Ano Novo. E, por isso mesmo, costuma ser chamada de faxina de Ano Novo.

Planejar uma grande faxina para o mês de dezembro pode ter diversas motivações. As pessoas práticas aproveitam o décimo terceiro salário para consertar móveis ou eletrodomésticos quebrados, substituí-los por outros mais modernos, ou fazer obras e pintura na casa. As mães costumam incentivar os filhos a doar os brinquedos antigos, deixando espaço para os presentes de Natal. As escolas incentivam os alunos a fazer doação dos livros escolares usados. E as crianças aproveitam para pedir que os pais renovem suas roupas e sapatos.

Nos países onde o inverno é muito rigoroso, e a casa fica vários meses fechada, a faxina anual é feita na primavera. Nos Estados Unidos é chamada de limpeza da primavera (Spring Cleaning). Aqui no Brasil, onde o calor do verão está cada vez mais difícil de suportar, muitas pessoas estão fazendo a faxina anual na primavera. Como a primavera nem sempre tem temperaturas amenas, e não gosto de calor, este ano, comecei minha faxina anual no início do inverno.
 
Para desmontar minha mesa de computador e uma cama de solteiro que seriam doados, foi preciso convocar toda a família. Enquanto um tirava os parafusos, os outros seguravam partes do móvel. A mesa deu um trabalho imenso. Tirar o computador e a impressora, e transferi-los para locais provisórios, sem retirar os fios dos seus respectivos lugares, foi uma tarefa quase impossível. Eram tantos os fios e tão bem enrolados uns nos outros que, puxando um deles, os outros iam junto. O monitor e o CPU ficaram sobre uma mesa e a impressora sobre um gaveteiro. O modem, ligado a um emaranhado de fios, ficou equilibrado sobre o CPU. Por segurança, a mesa e o gaveteiro não poderiam ser movidos, até que a nova mesa chegasse. Mas, antes que isso acontecesse, o modem caiu no chão e dividiu-se em três partes. O susto foi grande, mas a parte central dele, a principal, continuou funcionando.
 
Diante dessa emergência, foi preciso chamar o técnico. Ele marcou uma visita para o dia seguinte, não veio, e só apareceu aqui uma semana depois. Uma semana, também foi o tempo que os móveis desmontados ficaram atravancando o corredor da casa, porque a pessoa que viria buscá-los teve contratempos. Felizmente a nova mesa do computador chegou, e foi levada da sala até o quarto com cuidado, para que não colidisse com as tranqueiras do corredor. O único problema, era a necessidade de arrastar um enorme guarda-roupa que impedia sua entrada no quarto.
 
Arrastei o guarda-roupa, ajudei a empregada a tirar a poeira acumulada atrás dele, enquanto meu filho empurrava a mesa, e tornei a colocá-lo no lugar. Depois, coloquei o monitor e o CPU nos seus devidos lugares, aproveitando para fazer uma caprichada limpeza neles, no teclado, nos fios e na impressora. E, não satisfeita, ainda limpei a parede atrás da mesa, mesmo sabendo que dois dias depois um pintor viria dar o orçamento de pintura em alguns cômodos da casa. Foi uma boa ideia, porque o pintor não veio, remarcou para a semana seguinte, não veio novamente, e avisou que não poderia fazer o serviço.
 
No dia seguinte desse arrastão, acordei com muita dor no braço e no punho direito. Durante muitos dias precisei tomar um medicamento para a dor que me incomodava dia e noite. No punho, apareceu uma forte mancha roxa que demorou a desaparecer.
 
Quando o técnico finalmente veio consertar meu lento e amado computador, recebeu uma enorme lista com os problemas dele. Mesmo que eu não criticasse o meu computador, ultimamente estava difícil trabalhar nele. Devido a dificuldade em gravar CDs para fazer backup, eu temia perder muitos arquivos importantes. Felizmente fui lembrada sobre a existência dos pen drives, e consegui salvar quase todos os arquivos. O pouco que restou, o técnico salvou. E, após quase seis horas de trabalho, meu computador estava formatado, e funcionando quase como se fosse novo. Para uma próxima visita, ficou a troca do gravador de CD e do antiquado modem de 2 megas.
 
Para providenciar a troca do modem, liguei para o provedor, e fiquei contente em saber que com o novo plano não pagaria mais aluguel de modem, o que tornava a mensalidade mais barata. Aparentemente, o teleatendimento do provedor fica no Nordeste pois, além de falarem muito rápido, os atendentes tem um forte sotaque nordestino, que me obriga a pedir que falem mais devagar para que eu entenda o que dizem. Após esse pedido, são raros os atendentes que não demonstram irritação, o que dificulta ainda mais a conversa. Mas parecia estar tudo bem, só que o novo modem, que deveria vir pelo correio, não chegou no dia marcado. Mesmo assim, eles começaram a enviar 10 megas para o velho modem de 2 megas, que não resistiu, me deixando sem internet.
 
Nesse dia, após as duas horas e meia, em que falei com umas dez pessoas diferentes do teleatendimento, repetindo sempre as mesmas informações e recebendo respostas totalmente diferentes, também anotei diversos números de protocolo que não serviam pra nada. Q

Quando finalmente conversei com uma atendente que não tinha sotaque e falava pausadamente, eu estava exausta e tive uma crise de choro quando ela me disse que o conserto demoraria mais de 24 horas. Eu não conseguia me imaginar passando por aquilo tudo novamente, caso continuasse sem internet no dia seguinte. Não sei se a crise de choro ou minha insistência em querer o assunto resolvido o mais rápido possível ajudaram, mas consegui cancelar a mudança do meu plano de 2 megas para 10 megas e ter a internet de volta, antes mesmo de desligar o telefone.
 
Depois desse incidente, mesmo tendo feito somente uma parte da arrumação que desejava, já que algumas coisas só poderão ser feitas após a pintura das paredes, resolvi parar um pouco para descansar. Em breve, as férias de julho irão terminar e os jovens da família irão retornar de viagem. Descansados, poderão me ajudar nem que seja só com sugestões.
 
Enquanto isso, com calma vou recolocando meus arquivos e programas preferidos de volta no computador. Ter uma atitude sem-pressa é normal no meu procedimento diário, a única mudança que irei fazer é redobrar a atenção com meu braço. Mesmo que esteja aparentemente curado, ele ainda precisa de cuidados para que a dor não volte a incomodar.
 
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Nota - Crônica jornalística (apresenta aspectos particulares de notícias ou fatos cotidianos)
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(Outono outra vez)

 
Outono outra vez
- © Lenise M. Resende -

Quando o outono chegou, respirei aliviada. O verão tinha sido uma quentura só. E, mesmo que o outono começasse com calor e umidade, aos poucos, a temperatura iria ficando mais amena. Isso seria ótimo!

Alguns dias depois do início do outono, eu já não estava respirando muito bem. Depois de apanhar uma ventania com o corpo suado, peguei a primeira gripe da estação. Antes de ficar totalmente curada, outra ventania me fez ter uma recaída ou ter a segunda gripe da estação. Nem sei mais... Em pouco tempo, eu já desconfiava que estava com sinusite, também. A cabeça parecia que nem funcionava mais, tão grande era o mal estar. Os olhos lacrimejavam tanto que dava vontade de colocar um para-brisa nos óculos.

Quando estava trabalhando em alguma imagem no computador, só considerava o serviço pronto depois que outra pessoa desse uma olhada. Não adiantava limpar a tela do computador, lavar os óculos e colocar colírio na vista, a sensação era sempre de imagens embaçadas. Quando conversava com alguém, tinha dificuldade de acompanhar o assunto. E responder perguntas era pior ainda. Meu marido perguntava: "O que você quer que eu traga do mercado?" Eu pensava um pouco e respondia: "Traz o que você quiser!" Mas, as perguntas mais difíceis, eram as relacionadas com comida: "Esse doce está bom?" "Hum! Não sei! Não estou sentindo gosto de nada!"

Creio que nunca escovei os dentes tantas vezes seguidas, como naquele outono. E o alívio durava pouco. Havia sempre um gosto esquisito na boca. A fome se anunciava mais como uma sensação de fraqueza, de quase desmaio. E, aí, o gosto da comida era o menos importante. Os melhores alimentos eram os líquidos e os pastosos. Ainda bem que gosto de sopa e sou apaixonada por purê de batata. Essa dieta quase hospitalar, me fez adquirir um hábito trazido pelos jovens daqui de casa - a caneca de louça. Assim, eu que implicava com elas, escolhi a maior de todas para mim. É uma delícia, tomar uma sopa quente bem devagarzinho, enquanto se esquenta as mãos colocadas ao redor da caneca.

Outro hábito, adquirido num outono bem distante, foi o uso do edredom, como substituto do cobertor. Lembro que eu havia ficado noiva e recebi dois cobertores de presente: um de solteiro, na cor salmão, e outro de casal, vermelho e bem felpudo. O de solteiro, ainda cheguei a usar por algum tempo, até descobrir que tinha alergia respiratória. Como meu futuro marido tinha o mesmo problema, compramos o primeiro dos muitos edredons que já tivemos. Naquela época, edredom era artigo raro e de luxo. Hoje, felizmente, é um hábito nacional, pois meus filhos também tem alergia respiratória.

Numa família de pessoas alérgicas, os cuidados para manter os alérgenos inaláveis sob controle vira rotina. Nada de tapetes, cortinas somente as que possam ser lavadas, chão que possa ser limpo com pano úmido, etc., etc. Com o tempo, a pessoa alérgica chega a achar que já leu tudo sobre o assunto. Foi o que pensei, até ler um artigo do Dr. João Curvo, intitulado "O outono, os pulmões, a justiça e a tristeza".

Na parte inicial, ele mostra como o calor e a umidade do outono nos deixam vulneráveis às afecções respiratórias. E associados ao vento (quente ou frio), que desestabiliza nosso equilíbrio energético, podem provocar gripe, sinusite, faringite, tosse, bronquite, otite e paralisia facial. Em seguida, fala do outono como a época de limpar o jardim, eliminando as ervas daninhas. E, por analogia, como a época de limpar a própria vida, verificar o que deve sair e o que deve permanecer, sejam hábitos, sentimentos ou relacionamentos. Na China, ele diz, o Ministério da Justiça é conhecido como Ministério do Outono e, as sentenças mais duras, eram amadurecidas no outono.

Lendo esse artigo, entrei no túnel do tempo e, encontrei um grande número de outonos passados, onde ocorreram momentos marcantes na minha vida. Foi um reencontro doloroso e triste mas, como não sou fatalista, guardei as informações e as recordações e segui em frente. Até que um dia, meses depois, abatida com os sintomas de uma gripe, me espantei ao ouvir uma das chamadas do jornal na televisão: "Hoje, vinte de março, inicia-se o outono!" E, as pessoas que estavam ao meu lado, também se espantaram, ao me ouvir exclamar: - Puxa vida! Tenho tantas coisas para fazer e já é outono outra vez!

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Nota - Crônica jornalística (apresenta aspectos particulares de notícias ou fatos cotidianos)
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(Verão 2010)


O verão dos meus sonhos
- © Lenise M. Resende -

Sem saber o motivo, os seguidos anúncios de chegada de frente fria no Rio de Janeiro, intrigavam os cariocas que acompanham os telejornais.

Só em novembro foi noticiado que, desde outubro, o fenômeno climático conhecido como La Niña, tem resfriado as águas do Oceano Pacífico equatorial. É o La Niña que está facilitando a chegada das massas de ar polar na cidade. Para os moradores do Rio de Janeiro, isto tem sido refrescante.

É muito bom viver e, principalmente, dormir sem precisar ligar o ar condicionado. É um alívio ver que, apesar do reajuste de 2,01% nas tarifas de fornecimento de energia elétrica, a conta de luz não está assustadoramente alta.

No verão passado, na tentativa de baixar o consumo de energia, troquei o ar condicionado do meu quarto. No quesito consumo de energia, o novo aparelho correspondeu as minhas expectativas. Mas, no resfriamento do ambiente, ele me decepcionou. E, após seis meses de uso, parou de funcionar. Depois de cinco meses, e vários desentendimentos com o serviço de garantia, o compressor dele foi trocado.

Como o retorno do ar condicionado coincidiu com a chegada das frentes frias, ele ainda não foi bem testado. Por enquanto, nos dias mais quentes, o ventilador de teto tem sido eficiente. Aliás, eficiente até demais.

Há uns dois anos, quando o ventilador de teto do meu quarto precisou ser substituído, comprei um modelo com duas velocidades. A velocidade mais fraca, nos dias de muito calor, pouco adianta. Já a velocidade mais forte, produz uma ventania que refresca bem o ambiente mas, algumas vezes, chega a ser irritante. Para dormir com o ventilador ligado, e não acordar com a cabeça pesada, preciso cobri-la com um lençol.

Outra coisa que aborrece muito é que, funcionando na velocidade máxima, ele vai jogando a poeira para o teto. Para quem mora em rua asfaltada isso significa que, mesmo limpando o teto constantemente, ele vai ser sempre meio cinzento. Coincidência ou não, desde que troquei o ventilador de teto tenho tido mais gripes. Depois de tanto respirar poeira de asfalto, estou até receosa que meu pulmão esteja parecido com pulmão de fumante.

Não sei até quando o La Niña vai facilitar a chegada das massas de ar polar na cidade. Espero que seja até o final de março do próximo ano. Um verão com muito sol e temperaturas amenas, certamente agradaria os turistas e os moradores da Cidade Maravilhosa. E seria o verão dos meus sonhos.

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- Atitude sem pressa

(O urubu e a cigarra)


O urubu e a cigarra
- © Lenise M. Resende -
 
O urubu comum é uma ave feia que voa bonito. Seu voo é tão bonito que chama a atenção de quem costuma olhar para o céu. E eu sou uma dessas pessoas.

Sou capaz de ficar horas seguidas admirando a cor do céu, e as nuvens mudando seu desenho, conforme o vento sopra lá nas alturas. Só não sou capaz de ficar horas seguidas admirando o voo dos urubus, porque eles não ficam muito tempo no mesmo lugar.
 
O show deles é rápido: um deles aparece planando no céu, logo outro vem chegando, e mais outro. Quando o bando se reúne, eles voam em círculos, procurando alimento. Dependendo do lugar onde estão, fico imaginando se tem algum lugar lá no chão onde podem encontrar algo comestível.

Em geral, é alarme falso, porque o bando vai mudando o círculo de lugar. E, quando menos espero, um deles se afasta planando. Logo outro segue o mesmo caminho, mais outro, e o círculo se desfaz.

Muitas pessoas que dizem apreciar o voo dos urubus moram em andar alto. E é aí que mora o perigo! Em São Paulo e Brasília, os urubus estão colocando ovos nas varandas dos apartamentos, e atacando os moradores. Apreciar o voo dos feiosos é uma coisa, mas dar de cara com um deles é outra.
 
Não me parece possível que um urubu pouse na minha janela. Que sorte! Por muito menos, quase morri do coração quando uma voadora feiosa, uma cigarra, pousou na minha janela.
 
Lembro que o dia começava a clarear, por volta de cinco horas da manhã, e a claridade me acordou. Como havia chovido no dia anterior, deixei um pedacinho do vidro da janela aberto, e também um pedaço da cortina. Mas, aquela amostra de claridade, indicava que o dia ia ser de sol bem forte.
 
Antes que eu decidisse se voltava a dormir ou fechava a cortina, ouvi um barulho de asas. Quase que imediatamente, a cigarra que pousou no parapeito da minha janela começou a cantar. E o resultado da cantoria estridente foi que levei um susto tão grande que, com o coração quase saindo pela boca, comecei a procurar por ela.

Felizmente a fresta da janela era bem estreita e, mesmo que quisesse, ia ser difícil ela entrar no quarto. Mas, por garantia, fechei a janela e a cortina, liguei o ar condicionado e voltei a dormir.
 
Por isso, fazendo as devidas comparações entre o tamanho do inseto e o da ave, não quero nem pensar no que aconteceria se um urubu pousasse na minha sorte, ou melhor, na minha janela.

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Nota - Crônica jornalística (apresenta aspectos particulares de notícias ou fatos cotidianos)
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