(Sabedoria individual)


 Sabedoria individual
- © Lenise M. Resende -

Recebi um pequeno texto intitulado Sabedoria Indígena. Ele nos faz refletir sobre promessas ou o cumprimento delas, isto é, sobre a necessidade de agir de acordo com o que se fala. Esse é o tipo de texto que leio, releio, e paro para pensar nas inúmeras mensagens que estão nas entrelinhas.

Promessa é dívida, diz o dito popular. Prometeu tem que cumprir, diz o coro popular. Tanto as dívidas bancárias ou comerciais quanto as de caráter afetivo são promessas. As primeiras, são mais fáceis de provar sua existência e, por isso mesmo, mais facilmente cobradas.

As dívidas de caráter afetivo, costumam ser feitas somente através de palavras e, em geral, são mais difíceis de serem cobradas judicialmente. Neste caso, as cobranças costumam envolver as chamadas "explicações". É isso mesmo, explicações, porque dificilmente um cobrador fica satisfeito com uma única justificativa. Uma promessa feita através de algumas palavras, é cobrada através de perguntas e respostas, isto é, de palavras e mais palavras. E, em geral, o devedor se enrola nas suas próprias palavras.

Como sou grande apreciadora da liberdade de falar e agir, recuso-me a fazer promessas. Por mais bem intencionada que eu esteja hoje, porque prometer fazer algo amanhã? Amanhã, por alguma razão, posso ter mudado de ideia. E, amarrada às minhas próprias palavras, à minha promessa, vou acabar fazendo o que não desejo. Vou fazer porque não abro mão de ser responsável por meus atos, mas vou ficar muito aborrecida comigo. Então, pra evitar que isso aconteça, recuso-me a fazer promessas.

Há quem faça promessas somente aos filhos, achando que criança esquece. Mas, quando o assunto é do interesse delas, as crianças lembram dos mínimos detalhes e cobram bastante. Além disso, elas parecem saber a hora exata de conseguir essas promessas. E, com uma voz muito doce, elas lançam a isca: "Se eu fizer isso hoje, você promete que no Natal me dá ..."

Como na minha memória não existe um arquivo intitulado promessas, nem adianta me provocar dizendo que esqueci. Eu não posso ter esquecido o que não prometi. Em relação a presentes, principalmente, gosto de surpreender.

Tudo que merece ser feito, merece ser bem feito, escreveu a poetisa Cora Coralina. Não só concordo com essa frase, como procuro sempre agir dessa forma. Se não puder fazer uma coisa bem feita, prefiro não fazer.

A liberdade não tem qualquer valor se não inclui a liberdade de errar, disse Mahatma Gandhi. Essa é outra frase que aprecio. Quando me proponho a fazer algo bem feito, isso não exclui a possibilidade de haver erros no meu trabalho. Principalmente quando se trabalha com imagens, um erro no uso de determinada técnica, também pode produzir uma bela obra.

Algumas vezes, ter um prazo para criar, pode ser um estímulo. Mas, se este estímulo for usado em excesso, acaba tendo efeito contrário. Por isso, prefiro que um de meus trabalhos seja escolhido para ser premiado, do que criar algo novo para concorrer a algum prêmio. Já não tenho muita inclinação para competição, então, qualquer pressão é motivo para que eu não participe.

Se a vida é um jogo, como dizem, e no trabalho, principalmente, existem dois estilos básicos de jogo: a cooperação e a competição; já fiz minha escolha. O prazer efêmero das vitórias não me seduz. Prefiro as conquistas de longa duração, saborear o cotidiano e caminhar com calma na companhia das pessoas que prezo.
 
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Nota - Crônica filosófica (reflexão a partir de um fato ou evento)
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Um comentário:

lenise-m-resende disse...

Sabedoria indígena - "Diz a sabedoria indígena que quando não cumprimos o que prometemos, o fio de nossa ação que deveria estar concluída e amarrada em algum lugar fica solto ao nosso lado. Com o passar do tempo, os fios soltos enrolam-se em nossos pés e impedem que caminhemos livremente... Ficamos amarrados às nossas próprias palavras. Por isso os nativos tem o costume de "por-as-palavras-a-andar" que significa agir de acordo com o que se fala; isso conduz à integridade entre o pensar, o sentir e o agir no mundo e nos conduz ao Caminho da Beleza onde há harmonia e prosperidade naturais."