- © Lenise M. Resende -
No Carnaval de 1934, Lamartine Babo fez a marchinha "História do Brasil", que começava assim: "Quem foi que inventou o Brasil? Foi seu Cabral! Foi seu Cabral! No dia 21 de abril, dois meses depois do Carnaval!"
Na verdade, Cabral aparece na História do Brasil, não como um inventor, aquele que descobre através do pensamento, mas como um descobridor, aquele que atesta pela primeira vez a existência de. No entanto, existem tantas controvérsias sobre o Descobrimento do Brasil, que chego a me indagar se Cabral existiu realmente ou foi inventado. E até me atrevo a pensar que a História do Brasil foi inventada, e que aprendemos na escola somente uma versão dos fatos reais.
Essa sensação de saber somente versões, deixa-me insegura ao falar sobre a História do Brasil. Sempre há um fato novo que modifica o que aprendemos na escola. E parece haver fatos que nunca ficarão bem esclarecidos.
Existem quatro datas comemorativas muito próximas que parecem ser as campeãs das versões. São elas: Em abril: 19, Dia do Índio; 21, Dia de Tiradentes: 22, Descobrimento do Brasil. Em maio: 13, Abolição da Escravatura.
Considero muito difícil escrever sobre os índios. Por mais que leia sobre eles, sempre penso que sei muito pouco. Encontrar na internet desenhos de índio brasileiro é mais difícil ainda. Até mesmo brasileiros desenham índios com indumentária americana. Antes de desenhar um índio brasileiro, pesquisei fotos recentes, e decidi que ele usaria short e não tanga.
Outro assunto difícil é a Abolição da Escravatura. Na escola, além de ter aprendido sobre os castigos infligidos aos escravos, gostaria de ter conhecido a mitologia africana. Aliás, gostaria de ter aprendido mais sobre a África. É claro que a verdade precisa ser dita, mas é preciso também divulgar a riquíssima cultura africana.
Essa postura em relação a divulgação, faz com que eu não repasse críticas ao governo brasileiro, por exemplo. Creio que o número de críticos já é bem elevado, prefiro usar meu tempo divulgando a cultura brasileira. Se mais pessoas dedicassem seu tempo divulgando nossa história e nossa cultura, talvez tivéssemos a sorte de ter um presidente mais informado. Aliás, se tivéssemos políticos mais cultos, já teríamos uma lei obrigando os candidatos a presidente a estudar História do Brasil por algum tempo, antes de se candidatarem.
Para Milton Santos, professor e consultor da ONU, a formação de estudantes visando o mercado de trabalho, que prioriza o saber prático, ameaça, a médio prazo, a democracia, a cidadania e a individualidade. Ele disse: "A escola deixará de ser o lugar de formação de verdadeiros cidadãos e tornar-se-á um celeiro de deficientes cívicos."
Em abril de 2005, ao visitar a África, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu perdão pelos africanos que foram trazidos como escravos para o Brasil, repetindo um gesto do papa João Paulo II. Certamente, um presidente mais culto, ainda cometeria enganos. Não teria, porém, a ingenuidade de imitar as atitudes de um Papa. Por mais espontâneo que um Papa seja, sabe-se que ele tem junto de si especialistas com quem estuda, principalmente antes de viajar. Então, ao reagir às emoções de uma viagem, seus gestos e suas palavras repercutem mundialmente, de forma positiva, o que nem sempre acontece com nossos presidentes.
Se Lamartine Babo estivesse vivo, talvez agora cantasse uma versão da marchinha "História do Brasil", com algo assim: "Quem foi passear em abril? O presidente! O presidente! No décimo dia de abril, dois meses depois do Carnaval!"
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Nota - Crônica jornalística (apresenta aspectos particulares de notícias ou fatos cotidianos)
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Um comentário:
Muito, muito bom! Bela esplanação de ideias, bons argumentos, lisura, respeito, humanismo... muito, muito bom! Luciene Lima
21 abril, 2005
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