(O mito do amor romântico)


O mito do amor romântico
- © Lenise M. Resende -
 
Mês de junho. Dia dos namorados chegando. Na televisão, novela romântica. No rádio, música romântica. Contagiadas pelo romantismo, as pessoas começaram a falar sobre o amor. Fiquei calada. Mas, quando indagada sobre o amor, comecei a pensar. E pensando, fui escrevendo.
 
Sonhar com um amor, não é fazer do sonho uma ave que, voa livre e independente, sem retornar ao ponto de partida. Mas fazer do sonho uma pipa, que voa enquanto o tempo for bom e o vento favorável. Se uma tempestade se aproxima, podemos recolher a pipa (o sonho) e aguardar dias melhores. É o que chamo de sonhar com os pés no chão. Não consigo só pensar e pensar... idealizar e não realizar. Aliás, a melhor definição que li sobre a mulher capricorniana, dizia: "No amor tem uma determinação de aço: quer ou não quer. Ela não se satisfaz com pouco afeto. Economia de amor, dela e para ela, não significa nada. Emoção é para gastar. O sonho tem que ser praticado."

Amor platônico, aquele que nunca se concretiza, deve ser triste demais. "Platônico" vem de Platão, o filósofo grego que acreditava na existência de dois mundos - o das ideias, onde tudo seria perfeito e eterno, e o mundo real, finito e imperfeito, mera cópia mal-acabada do mundo ideal.

Amor virtual, pode ser desgastante demais e emocionalmente perigoso. A comunicação somente através da escrita e da voz, facilita a construção de pessoas idealizadas. Facilita ver romantismo onde só há fantasia. Como amar alguém sem rosto? Amar alguém muito distante, que não possa ser visto nem tocado, me parece impossível, se não houver de ambas as partes interesse em um conhecimento real.

Mesmo sendo mulher e poetisa, não me acho romântica. Fui pesquisar sobre romantismo, para ter certeza de que sei o exato significado da palavra. Encontrei num site de psicologia uma descrição de pessoa romântica: não esquece o dia em que conheceu o seu amor e comemora a cada mês a data inesquecível; guarda a música que tocava quando dançaram pela primeira vez; manda cartõezinhos com palavras apaixonadas com ou sem pretexto; quer encontrar-se com seu parceiro em lugares bonitos; comer à luz de vela; etc.

E, no mesmo site, uma descrição da pessoa "não romântica": ama de forma diferente, mas nem por isso ama menos; prefere arroubos de amor do que o ritual do romântico; não manda flores na data esperada, e vive o dia a dia de forma mais racional e objetiva.
 
Uma mulher aparentemente "não romântica", pode passar a vida toda fazendo os pratos que cada membro da família gosta. E ninguém perceber que, em cada prato especial, havia um recado, um "eu te amo", um "parabéns". Se ela colocasse cartõezinhos com mensagens nos pratos, seria considerada romântica? Certos gestos românticos, só são úteis, para quem se sente obrigado a provar que ama ou quem tem tempo sobrando para gastar.
 
Num outro site, encontrei uma interessante observação sobre tipos de romance: obrigatório e opcional. No obrigatório, comemora-se datas fixas (aniversário, Natal, Dia dos Namorados). No opcional, é preciso ser mais criativo - comemorar datas "surpresa" ou fazer pequenas e grandes surpresas.
 
Comemorar somente datas fixas é monótono. Enviar todos os anos as mesmas rosas vermelhas no dia do aniversário. Dar o novo CD do Roberto Carlos no Natal. Comprar os mesmos bombons e as mesmas rosas vermelhas no Dia dos Namorados. Gosto mais da ideia do romance opcional. Mandar bilhetinhos ou poesias no dia a dia é uma de minhas preferências. Adoro surpresas e, mais ainda, surpreender.
 
Há quem faça distinção entre presente e lembrança. Presente seria dar algo que desejamos que o presenteado tenha. Lembrança seria dar algo que a pessoa que vai receber deseja. Creio que o nome certo não importa, quando se recebe algo desejado. Nem todas as mulheres sonham em receber um buquê de rosas. Há aquelas que preferem receber margaridas. E, para saber, basta observar ou perguntar. 
 
Enquanto pensava e escrevia, concluí que estou bem satisfeita com meu modo "não romântico" de amar. Não tenho coleção dos papéis de bombons recebidos, pétalas de flores dentro de livros, retratos escondidos em caixas secretas ou qualquer coisa parecida. Tenho muitas poesias escritas, dedicadas a quem as mereceu, e, o mais importante, muitas lembranças guardadas só de memória, porque nunca tive diário.

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Nota - Crônica filosófica (reflexão a partir de um fato ou evento)
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4 comentários:

Luciene Lima disse...

Muito, muito, muito bom! Amplo, dinamico, explicativo, diretivo, confortador, muito, muito bom! Luciene

junho de 2005

acas disse...

O seu texto nos dá a ideia de como o amor é e como deveria ser. Seus argumentos, lógicos e bem urdidos, alicerçados em experiência de vida, nos remete a análise de nossas próprias vidas. Muito bom. Parabéns pelo belo texto e Feliz dia dos Namorados.

junho de 2005

raylsonbruno disse...

Amemos, cada qual a sua maneira, mas amemos!

Mariza Lourenço disse...

Lê, posso agradecer? Eu precisava ler isso, precisava mesmo. Você salvou minha madrugada, minha segunda, minha semana toda. Há poucas horas eu escrevi um texto contundente acerca de não acreditar em livros de auto ajuda ou em mensagens com propósitos aconselhativos (existe essa palavra? não importa, fica assim mesmo). Retiro, em parte, o que escrevi, porque ao ler sua crônica (uma das melhores que já li), entendi um tanto de coisa ou enxerguei de um outro modo, certas coisas que me incomodavam muito, e para as quais eu não tinha resposta... Valeu demais! Beijo carinhoso, Mariza

junho de 2003